 |
Catarina Eufemia |
«MATARAM-NA POR CINCO TOSTÕES»
À CONVERSA COM MARIANA CASCALHEIRA,
CAMPONESA DE QUINTOS*
Entrevista por Miguel Patrício
"La uccisero per cinque scudi"
Dialogo con Mariana Cascalheira, contadina di Quintos
Vila, amiga e companheira de Catarina Eufémia, Mariana Teresa Correia
Cascalheira, de Quintos, concelho de Beja, é um testemunho vivo imprescindível
para se tentar compreender, por um lado, como é que os trabalhadores rurais
alentejanos e as suas (grandes) famílias viviam nos anos Cinquenta, por outro,
um pouco da personalidade da mártir camponesa, que, mais do que uma jovem irreverente,
foi uma consciente lutadora política, com ligações ao único partido clandestino
existente e em actividade na altura, o Partido Comunista Português.
Compaesana, amica e compagna di Catarina Eufemia, Mariana Teresa Correia
Cascalheira, di Quintos, comune di Beija, è la testimonianza viva e
imprescindibile per cercare di capire, da un lato, come vivevano i braccianti
agricoli alentejani e le loro grandi famiglie negli anni Cinquanta, dall’altro
un po’ della personalità della martire contadina, che, più che una giovane
irriverente, è stata una cosciente lottatrice politica, con legami con l’unico
partito clandestino attivo in quel periodo, il Partito Comunista Portoghese.
Mariana Cascalheira, nascida a 29 de Maio de 1936, pertence a uma velha
geração de mulheres do Alentejo que, quando crianças, deixaram a escola (era
sozinha de mulher», como nos disse) para ajudar os pais a criar os irmãos,
executando os mais diversos trabalhos domésticos. Como a maioria dos filhos dos
rurais alentejanos, começou a trabalhar no campo muito cedo, apenas com 11
anos. Cedo? Se Mariana começou a trabalhar cedo, que dizer dos irmãos, que
começaram a trabalhar aos 5 anos?
Mariana Cascalheira, nata il 29 Maggio del 1936, appartiene a una vecchia
generazione di donne alentejane che da bambine abbandonarono la scuola (“ero l’unica
donna”, ci ha detto) per aiutare i genitori a crescere i fratelli, occupandosi
di vari lavori domestici. Come la maggior parte dei figli dei braccianti alentejani,
ha cominciato a lavorare nei campi molto presto, a soli 11 anni. Presto? Se
Mariana ha cominciato a lavorare presto, che dire allora dei suoi fratelli, che
hanno cominciato a lavorare a 5?
No diálogo (não lhe chamamos entrevista) que teve connosco - e que aqui
tentamos reproduzir de forma simples, respeitando o máximo possível a linguagem
oral, embora, naturalmente, sem a imprescindível vivacidade da mímica -,
Mariana Cascalheira começa por nos descrever os seus tempos de infância e
juventude e revela-nos os motivos que levaram os seus familiares próximos a
passar de camponeses a operários, na Área Metropolitana de Lisboa.
Propositadamente, fizemos algumas perguntas provocantes a Mariana, nomeadamente
em relação à Reforma Agrária e à actividade do PCP no Alentejo nos anos
Cinquenta, tendo a velha camponesa respondido de forma inteligente,
acrescentando que a Reforma Agrária «já não volta no meu tempo, mas há-de
voltar».
Nel dialogo (non lo chiamamo intervista) que ha avuto con noi- e che qui
cerchiamo di riprodurre in forma semplice, rispettandone al massimo il
linguaggio orale, nonostante manchi l’imprescindibile vivacità della mimica -Mariana
Cascalheira ci comincia a descrivere la propria infanzia e gioventù ai suoi
tempi e ci rivela i motivi che portarono i suoi parenti a passare da contadini
a operai nell’area metropolitana di Lisbona. Di proposito, abbiamo fatto alcune
domande provocatorie a Mariana, in relazione e rispetto alla Riforma Agraria e all’attività
del Partito Comunista in Alentejo negli anni Cinquanta, l’anziana contadina ha
risposto in modo intelligente, aggiungendo che la Riforma agraria “Non tornò
più ai tempi miei, ma deve tornare”
Mariana Castalheira fala-nos de Catarina Eufémia, «uma mulher que sabia o
que queria e o que dizia». Por último, a velha camponesa fala-nos da sua experiência
como presidente da Junta de Freguesia de Quintos, já depois do 25 de Abril.
Mariana Cascalheira ci ha parlato di Catarina Eufemia, “Una donna che
sapeva ciò che voleva e ciò che diceva”. Infine, l’anziana contadina ci ha
parlato della sua esperienza come presidente della giunta comunale di Quintos,
subito dopo il 25 Aprile.
Com que idade começou a trabalhar?
A quanti anni ha cominciato a lavorare?
(Um sorriso e um longo suspiro) Ai, ai!... Comecei a trabalhar com 11 anos.
(Un sorriso e un lungo sospiro) Ai, ai!...Ho cominciato a lavorare a 11
anni
Andou na escola?
E’ andata a scuola?
Graças a Deus.
Grazie a Dio.
Até que classe?
Fino a che classe?
Até à 3.ªFiz a 3.ª classe com 9 anos.
Fino alla terza, ho fatto la terza a 9 anni.
Porque não fez a 4.ª classe?
Perché non ha fatto la quarta classe?
Eu tinha seis irmãos e era sozinha de mulher e, então, a minha mãe
trabalhava no campo e eu ficava em casa cuidando dos meus irmãos.
Avevo sei fratelli ed ero l’unica figlia femmina, mia madre lavorava nei
campi e io restavo a casa occupandomi dei miei fratelli.
Era mais nova, mais velha?
ra più grande più piccola?
Era mesmo ao meio. Havia três mais novos e três mais velhos, éramos sete.
Ero proprio in mezzo. Avevo tre fratelli più piccoli e tre più grandi,
eravamo sette.
A senhora é que tinha de tratar da casa?
Era lei che doveva occuparsi della casa?
Sim senhor. O meu pai sempre possuiu gado e tínhamos muito trabalho.
Si signore. Mio padre ha sempre avuto il bestiame e avevamo molto lavoro.
O seu pai era pequeno agricultor?
Suo padre era un piccolo agricoltore?
Não, era amigo de criar gado, tinha sempre assim um «rebanhito”. Era
pastor. Depois o meu pai fez uma aventura que, se calhar, muita gente não era
capaz de fazer. Com cinquenta e tal anos, foi para Alverca do Ribatejo.
No, gli piaceva il bestiame, così aveva sempre un piccolo gregge. Era
pastore. Mio padre un giorno ha fatto un’avventura che forse molte persone non
sarebbero state capaci di fare. A cinquant’anni e più andò a Alverca do
Ribatejo.
Foi para lá trabalhar?
Andò li per lavoro?
Como aqui não havia trabalho, os meus irmãos mais novos levavam os verões
Inteiros sem trabalhar e então foram para Alverca. Convidaram a minha mãe para
ir lá, ela foi ver e não gostou da maneira como estavam sendo cuidados,
trabalhando e maltratados... A minha mãe veio, falou como meu pai, venderam as
coisinhas todas que tinham e foram para Alverca. Estiveram lá 18 anos, olhando
pelos meus Irmãos e a trabalhar.
Siccome qui non c’era lavoro, i miei fratelli più piccoli passavano intere
estati senza lavorare allora partirono ad Alverca. Invitarono mia madre ad
andare là, lei andò a vedere e non le piacque il modo in cui venivano trattati,
lavoravano maltrattati….Mia madre vide, parlò con mio padre, poi vendettero
tutte le cose che avevano e andarono ad Alverca. Sono stati là 18 anni,
occupandosi dei miei fratelli e lavorando.
Em Alverca trabalhavam no campo ou em fábricas?
Ad Alverca lavoravano nei campi o in fabbrica?
Os meus irmãos trabalhavam em fábricas e o meu pai na construção civil,
dando serventia a pedreiro.
I miei fratelli lavoravano in fabbrica e mio padre nelle costruzioni, come
muratore
Portanto, de camponeses passaram a operários...
Pertanto da contadini siete passati a operai….
Sim senhor... o meu pai com cinquenta e tal anos. O meu pai nunca gostou de
lá estar, mas, para ajudar os filhos...
Si signore….mio padre a cinquanta e più anni. A mio padre non è mai
piaciuto star lì, ma per aiutare i figli…
Isso foi em que ano, lembra-se?
Quando avvenne ciò, in che anno? Si ricorda?
Há 45 anos (1958).Nessa altura abalou muita gente do Alentejo...
Pois, era um tempo de fome, de muita fome.
Da 45 anni (1958). In questo periodo molta gente dell’alentejo era
sconvolta perché erano tempi di fame, di molta fame.
E a senhora ficou aqui em Quintos ou também foi para Alverca?
E lei restò qui a Quintos o andò ad Alverca?
Eu fiquei, já era casada. E também ficaram dois irmãos meus.
Io restai, ero già sposata. E restarono anche due miei fratelli.
E a D. Mariana começou a trabalhar com 9 anos em quê?
E Dona Mariana in cosa cominciò a lavorare a 9 anni?
Comecei a trabalhar com 11 anos, aos 9 foi quando fiz a 3.ª classe. O
primeiro trabalho que fiz foi mondar.
Ho cominciato a lavorare a 11 anni, a 9 facevo la terza classe. Il primo
lavoro che ho fatto è stato mondare
A monda durava quanto tempo?
Quanto durava la monda?
Começávamos aí em Janeiro, depois era a monda do grão e essas coisas
todas... era até Maio, até que viesse a «aceifa». Nos fins de Maio já se
ceifavam favas e cevada aveia, depois era o trigo, até Julho. Às vezes já
estava muito calor e a gente não aguentávamos e ceifávamos só até ao meio-dia.
Cominciavamo a Gennaio, dopo c’era la monda del grano e tutte le altre cose…era
fino a Maggio, fino a che arrivasse la mietitura. A fine Maggio si mietevano le
fave e orzo avena, dopo c’era il grano fino a Luglio. A volte faceva molto
caldo e non lo sopportavamo e mietevamo solo fino a mezzogiorno.
A apanha do grão era à noite?
E la raccolta del grano era la sera?
Pois, o grão era à noite, da uma da manhã até às dez e meia, coisa assim.
Tinha de ser apanhado pela fresca, senão cai para o chão.
Si, il grano era la sera dall’una alle dieci e mezzo del mattino circa.
Doveva essere raccolto col fresco sennò cadeva a terra
Iam a pé para o local do trabalho?
Andavate a piedi sul posto di lavoro?
Nem que fosse no fim do mundo, íamos a pé.
Pure se fosse stato alla fine del mondo, andavamo a piedi
E a apanha da azeitona era cm que altura?
E la raccolta delle olive in che periodo era?
Começávamos no fim de Outubro e era até fins de Natal.
Cominciavamo alla fine di Ottobre e era fino alla fine di Natale
A apanha da azeitona era (é) difícil, por causa do frio e da chuva.
Começavam a trabalhara que horas?
La raccolta delle olive è difficile a causa del freddo e della pioggia. A
che ora cominciavate a lavorare?
Começávamos às oito horas, mas tínhamos de abalar de casa aí às seis ou
sete da manhã, conforme o local para onde íamos trabalhar, se era perto ou
longe. Depois, voltávamos às sete horas da noite, sem luz, sem nada, todas
molhadas e mal agasalhadas... Muitas das minhas camaradas ainda vinham
carregadas com lenha para se aquecer aquele bocado da noite. Eu nisso tive
sorte, porque o meu pai tinha burros e carregava a lenha. Mas havia pessoas que
andavam na minha companha que, ao fim de um dia de trabalho, ainda vinham com
um molho de lenha à cabeça.
Cominciavamo alle otto, ma dovevamo partire in fretta alle sei o sette del
mattino in base al luogo di lavoro, se era vicino o lontano. Dopo tornavamo
alle sette di sera, senza luce, senza niente, tutte bagnate e mal coperte…molte
delle mie compagne tornavano cariche di legna per riscaldarsi quel po’ di
notte. Io ho avuto fortuna, perché mio padre aveva asini e caricava la legna.
Ma c’erano persone che erano nella mia compagnia che, alla fine di una giornata
di lavoro, se ne tornavano ancora con un pezzo di legno sulla testa.
A apanha da azeitona era um trabalho cansativo, com a agravante do frio e
da chuva?
La raccolta delle olive era un lavoro pesante, con l’aggravante del freddo
e della pioggia?
Pois. A gente muitas vezes ficávamos com os dedos
todos dormentes.
Si. Noi molte volte ci trovavamo con le dita tutte addormentate
Usavam luvas?
Usavate guanti?
Não, não se podia apanhar azeitonas com luvas. A gente chegámos a pontos de
andarmos trabalhando à azeitona sem comer. Não deixavam tão-pouco a gente
comer.
No, non si potevano raccogliere le olive con i guanti. Noi arrivavamo al
punto di andare a lavorare alle olive senza mangiare. Non ci permettevano
nemmeno di mangiare…
Então porque?
Perché?
Não tínhamos hora de almoço. E ninguém podia dizer nada. Se alguém tentava
dizer alguma coisa, no outro dia já não podia trabalhar.
Non avevamo l’ora per pranzare. E nessuno poteva dire niente. Se qualcuno
provava a dire qualcosa, il giorno dopo non poteva lavorare.
Quando começou a trabalhar, com 11 anos, quanto é que ganhava por dia?
Quando cominciò a lavorare a 11 anni quanto guadagnava al giorno?
Ai! já não me lembro, mas, se calhar, aí uns seis escudos (0,03 cêntimos)
por dia. Eu ainda cheguei apanhar e a descascar amêndoas três e quinhentos
(3$50- três escudos e cinquenta centavos) por dia.
Ai! Non mi ricordo più, ma all’incirca 6 scudi (0.03 centesimi) al giorno. Io arrivai a raccogliere e sbucciare mandorle
guadagnando tre e 500 (tre scudi e 50 centesimi) al giorno.
Quanto custava um pão nessa altura?
Quanto costava il pane in questo periodo?
Não me lembro, porque nessa altura toda a gente cozia o panito em casa. Só
as pessoas que viviam muito mal, muito mal, é que compravam o pão. Acho que um
pão de quilo custava à volta de dois escudos. Olhe, cozíamos o pão de noite:
amassávamos às oito horas da noite e quando a gente abalávamos para o trabalho
já deixávamos o panito cozido.
Non mi ricordo, perché in questo periodo tutta la gente couceva il pane a
casa. Solo le persone che vivevano molto male compravano il pane. Penso che un
chilo di pane costava circa 6 scudi. Senta, cuocevamo il pane la sera: alle otto
della sera lo impastavamo e la mattina quando scappavamo al lavoro lo
lasciavamo già cotto.
Amassavam todos os dias?
Lo impastavate tutti i giorni?
Não, de oito em oito dias. E, às vezes, cozíamos quando ainda tínhamos dois
ou três panitos duros, que era para não se comer logo os moles, para não se
comer tanto. O pão mole era mais desluzido, comia-se mais depressa. Pense lá
bem: a gente éramos nove pessoas lá em casa, cozíamos aí uns 35 ou 40 quilos
para a semana.
No, ogni otto giorni. E, alle volte, lo cuocevamo quando ancora avevamo 2 o
3 panetti duri, ed era per non mangiare subito quelli morbidi, per non mangiar
tanto. Il pane morbirdo era messo più in ombra, si mangiava più in fretta.
Pensate bene: in casa eravamo nove persone, cuoceamo all’incirca 35 o 0 chili a
settimana.
Ainda se lembra o que é que comiam nessa altura?
Si ricorda ancora ciò che mangiavate in questo periodo?
Eu não era daquelas que viviam mais mal. Havia quem comesse uma açordinha à
noite e andasse o dia todo sem comer. A gente lá em casa não passávamos essas
fomes. Também lhe digo uma coisa: o meu pai chegou a andar meses sem descalçar
as botas... se calhar só para lavar os pés, mas para dormir não, pois passava
muitas noites sentado numa pedra, chovendo, com o guarda-chuva aberto e com uma
manta, guardando o gado, tanto dele como dos outros. Para criar sete filhos,
pense lá bem como é que era.
Io non ero tra quelle che vivevano più male. C’erano quelle che mangiavano
una zuppetta la sera e poi passavano tutto il giorno senza mangiare. Noi in
casa non passavamo questa fame. Le dico anche un’altra cosa: mio padre era
arrivato a passare mesi senza togliersi gli stivali…forse solo per lavarsi i
piedi, ma per andare a dormire no perché passava molte notti seduto su una
pietra, mentre pioveva, con l’ombrello aperto e con una coperta, guardando il
bestiame, tanto il suo quanto quello degli altri. Per mettere al mondo sette
figli, ci pensi bene come era!
E o seu marido, o que é que fazia?
E suo marito cosa faceva?
O meu marido, agora reformado, era trabalhador do campo. Mais tarde, nos
anos Sessenta, foi trabalhar para a Alemanha. Depois do 25 de Abril só lá
esteve um ano e tal. Na Alemanha, trabalhava numa manutenção militar.
Mio marito, ora in pensione, era bracciante agricolo. Più tardi, negli anni
Sessanta, andò a lavorare in Germania. Dopo il 25 Aprile è stato là un anno
circa. In Germania lavorava per la manutenzione militare.
E a senhora deixou de trabalhar com que idade?
E lei quando ha smesso di lavorare?
Tinha aí uns 53 ou 54 anos.
Avevo 53 o 54 anni
Ainda trabalhou na Reforma Agrária? Em que cooperativa ou UCP [Unidade
Colectiva de Produção]?
Ha lavorato nella Riforma Agraria? In che cooperativa o Unità Collettiva di
Produzione?
Sim, aqui na UCP «Pioneiros da Reforma Agrária».
Si, qui nell’Unità Collettiva di Produzione “Pionieri della Riforma
Agraria
Foi melhor esse tempo ou antes do 25 de Abril?
E’ stato migliore quel periodo o prima del 25 Aprile?
Então que pergunta! Não tem comparação. Foi melhor.
Ma che domanda! Non c’è comparazione. E’ stato meglio quel periodo
Então foi melhor porquê?
E perché è stato migliore?
Porque todos tínhamos responsabilidade e todos defendíamos o nosso lugar,
não era preciso andar o capataz atrás, e isto e aquilo e o outro...
Perché tutti avevamo responsabilità e tutti difendevamo il nostro posto,
non c’era bisogno di andare dietro al capomastro e questo e quell’altro….
Na Reforma Agrária também não podiam almoçar, como acontecia no tempo do
agrário?
Anche nella Riforma agraria non potevate pranzare, come accadeva al tempo
della braccianza agricola?
Claro que comíamos. Eu não posso dizer mal da Reforma Agrária, porque lutei
muito por ela.
Certo che mangiavamo. Non posso dir male della Riforma, perché ho lottato
molto per lei.
Também não quero que diga mal. Só quero que me diga o que pensa da Reforma
Agrária.
Anch’io non voglio che ne parli male. Solo voglio che mi dica che ne pensa
della Riforma Agraria.
Nunca houve uma coisa melhor do que a Reforma Agrária. Deixou-me bastante
saudades. No meu tempo já não volta, mas há-de voltar.
Non ho mai sentito una cosa migliore della Riforma Agraria. Mi ha lasciato
abbastanza nostalgie. Non può più tornare indietro come ai vecchi tempi, ma deve
tornare.
O que fazia na UCP onde trabalhou?
Cosa faceva nell’Unione Collettiva di Produzione dove ha lavorato?
Fazia o mesmo, mas melhor e com mais gosto.
Facevo le stesse cose, ma meglio e con più piacere.
Na sua opinião, tinha uma salário justo? Dividiam os produtos por todos,
como era?
Nella sua opinione, aveva un giusto salario? Dividevate i prodotti tra
tutti, com’era?
Na UCP, trabalhávamos para a gente, não éramos explorados por ninguém, por
isso o salário era justo. Aqui na nossa UCP não dividíamos os produtos,
comprávamos tudo, mas mais barato. E os descontos não eram só para a gente, que
trabalhamos na Reforma Agrária, também eram para as pessoas da terra. Aquela
vacaria que além está, no tempo do agrário, havia um letreiro a dizer que era
proibida a entrada, e, depois, a partir da Reforma Agrária, passou a ser
diferente, «vendiam-no» o leite às pessoas da terra e dávamos para as escolas.
Nella Unione Collettiva di Produzione, lavoravamo per noi, non eravamo
sfruttati da nessuno, per questo il salario era giusto. Nella nostra UCP non
dividevamo i prodotti, compravamo tutto, ma a prezzi bassi. E gli sconti non
erano solo per noi lavoratori della Riforma Agraria, ma erano anche per gli
altri braccianti. Quella stalla che sta laggiù, al tempo delle bracciante,
aveva un cartello che diceva che era proibita l’entrata, dalla Riforma in poi,
è stato diverso, vendevano il latte ai braccianti e lo davano alle scuole.
E agora também é assim?
E ora è anche così?
Não, depois da Reforma Agrária acabaram com tudo.
No, dopo la Riforma finì tutto
No tempo da Reforma Agrária havia mais ou menos vacas e outro gado? Havia
mais ou menos produção?
Al tempo della Riforma c’erano pù o meno vacche e altro bestiame? C’era più
o meno produzione?
Havia mais produção, porque as pessoas interessavam-se mais, estávamos a
trabalhar para a gente e para a terra.
C’era più produzione, perché le persone erano più interessate, lavoravamo
per noi e per la terra
Quer dizer que a Reforma Agrária também foi boa para a própria freguesia?
Vuole dire che la Riforma fu buona anche per la stessa parrocchia?
Pois, além das pessoas da aldeia comprarem mais barato, depois havia mais
dinheiro e comprávamos máquinas, rações, sementes, adubos e coisas nas
mercearias de cá. A Reforma Agrária foi uma coisa muito boa para o povo todo.
Si, oltre al fatto che le persone del villaggio compravano a prezzi bassi,
c’era più denaro e compavamo macchinari, razioni, sementi, concime, e cose
nelle mesticherie locali. La Riforma Agraria è stata una cosa molto buona per
tutto il popolo.
Vamos agora falar um pouco sobre a Catarina Eufémia? Ela era de Baleizão ou
aqui do Quintos?
Parliamo ora un po’ di Catarina
Eufemia? Era di Baleizão o qui di Quintos?
Ela era de Baleizão. O marido dela era cantoneiro e veio trabalhar para cá,
por isso vieram para cá morar. Eles estiveram numas casas nó meio de Quintos,
mas por pouco tempo, porque a renda era alta, tinham três filhos e o marido
ganhava pouco. Por isso eles vieram morar para aqui [monte onde hoje habita
Mariana Cascalheira], porque isto não era uma casa como é agora, era um celeiro
e já velhote.
Lei era di Baleizão. Suo marito era cantoniere e venne qui a lavorare, per
questo vennero qui ad abitare. Loro stettero in una casa nei dintorni di
Quintos, ma per poco tempo, perché l’affitto era alto, avevano tre figli e il
marito guadagnava poco. Perciò vennero ad abitare qui (monte dove oggi abita
Mariana Cascalheira), perché qui non era una casa com’è adesso, ma un granaio e
vecchiotto.
E esta casa era de quem? Da sua família?
E questa casa di chi era? Della sua famiglia?
Esta casa era de um agrário. Ela [Catarina Eufémia] veio para Quintos e ele
arrendou-lhe a casa. Depois, foi fazer a «aceifa» a Baleizão, mataram-na e o
marido nunca mais quis saber...
Questa casa era di un agricoltore. Catarina Eufemia venne a Quintos e lui
gli affittò la casa. In seguito, fece la mietitrice a Baleizão, l’assassinarono
e il marito non ne volle più sapere…
Quando ela morou aqui, você morava aonde?
Quando Catarina abitò qui, lei dove abitava?
Naquelas casas ali ao lado, aquelas que estão caídas, que eram dos meus
pais. Éramos vizinhas. A coitada tinha uma vida muito difícil. Difícil era para
toda a gente nessa altura.
In quelle case lì da quel lato, quelle diroccate, che erano dei miei
genitori. Eravamo vicine. La poverina aveva una vita molto difficile. Era
difficile per tutti in quel periodo.
Ela chegou a pertencer ao seu rancho, trabalharam juntas?
Catarina apparteneva al suo gruppo, lavoravate assieme?
Mãe da minha alma!... «Lidi» com ela, conhecia-a tão bem como aqui as
minhas mãos. Então o último filho que ela teve nasceu ali ao lado... o primeiro
beijinho que ele apanhou foi meu... assim que «subo» que ela tinha tido o filho
vim logo lê-la. «Lidi» muito com ela.
Madre dell'anima mia! “Lottai assieme a lei, la conoscevo bene come queste
mie mani qui. L’ultimo figlio che Caterina ebbe nacque lì a a quel lato…il
primo bacio che ebbe fu il mio….così quando seppi che lei aveva avuto il figlio
venni subito a vederla. Lottai molto con lei.
Lembra-se do dia em que ela morreu?
Si ricorda il giorno che Catarina morì?
Lembro-me, mas eu não estava por aqui. Lembro-me do dia da abalada dela
para Baleizão. Eu fui para uma ceifa de empreitada. No dia que ela abalou, ia
morrendo logo no caminho.
Mi ricordo, ma non ero qui. Mi ricordo del giorno della sua fuga a Baleizão.
Io ero andata a una mietitura a cottimo. Il giorno che lei fuggì, stava morendo
già lungo quella strada…
Ia morrendo como?
Morendo come?
Abalou para Baleizão, a pé, com três filhos pequenos.
Fuggi a Baleizão, a piedi, con tre figli piccoli.
Foi pela estrada? Isto ainda são uns 10 quilómetros de Quintos a Baleizão?
Fu lungo la strada? Non ci sono 10 chilometri da Quintos a Baleizão?
Não foi pela estrada, foi a direito, atravessando aí os campos. Foi ela e
outra vizinha, que também era de Baleizão. E, então, no tempo da «aceifa» havia
sempre aquelas coisas, o patrão oferecia tanto, o trabalhador achava pouco e
não saía [não ia trabalhar], perdia-se às vezes dois e três dias.
Non fu per la strada, fu attraversando i campi intorno. C’era lei e
un’altra vicina, che era anche di Baleizão. E allora al tempo della mietitura
c’erano sempre quelle cose, il padrone offriva tando, il lavoratore pensava
fosse poco e non andava a lavorare, alle volte si perdeva due o tre giorni.
Era uma espécie de greve!?
Era una specie di sciopero?
Mas vindo aio terceiro ou quarto dia, as pessoas não tinham «mais remédio»
que era sair [ir trabalhar]. Ela como não era daqui e como o marido dela também
não ceifava, então nem sempre saía, porque cada qual puxava as suas mulheres
[trabalhadoras]... uma prima, uma irmã... e ela, coitadinha, ficava em casa,
sem trabalho. E então o que é que ela resolveu? Ir para Baleizão, deixava os
filhos com a sogra e fazia a «aceifa».
Ma dopo il terzo o quarto giorno, le persone non avevano altro rimedio che
andare a lavorare. Catarina siccome non era di qui e siccome suo marito non
mieteva…ciascuno (al proprio posto) mandava le proprie donne di famiglia a lavorare…una cugina,
una sorella…ma Catarina restava a casa senza lavorare. Allora come risolveva?
Andava a Baleizão, lasciava i figli alla suocera e faceva la mietitura.
E ela precisava de trabalhar...
E lei aveva bisogno di lavorare….
Pois, a coitada. A minha mãe e mulheres de outro tempo
estavam a lavar no barranco - nesse tempo não havia máquinas, não havia água
canalizada, não havia nada... lavávamos no barranco -, a minha mãe viu a Catarina
abalar com três filhos pequenos e disse-lhe: «Ainda assim, comadre Catarina,
para onde é que você vai?» Ela respondeu-lhe: «Vou para Baleizão. Vocês aqui
não saem, não saem, mas quando vem a terça ou a quarta-feira todos saem, todos
ganham e eu não ganho nada. Vou para Baleizão, a minha sogra fica-me com os
meus filhos e eu faço lá uma rica «aceifa». A minha mãe disse assim: «Ai,
comadre Catarina, com três filhos, ainda assim o que é que você vai fazer? O
seu marido ganha para o panito e o azeite, aonde é que você vai, mulher»!? As
mulheres do outro tempo, desde que houvesse pãó e azeite para a açorda... A
Catarina voltou-se para a minha mãe, tão zangada, e disse-lhe: «Então só
comemos pão e azeite»? Coitada, abalou... Ela abalou para Baleizão e a gente
abalou para uma empreitada, para os matos [zona de montado], ao pé de Corte
Condessa, na freguesia de Salvada. Andávamos ceifando, chega lá o dono da seara
e disse: «Sabem quem mataram em Baleizão? Foi a Catarina Eufémia». Ai!, eu
fiquei, valha-me Deus,... valha-me Deus, coitadinha. Mataram-na por cinco
tostões.
Si poverina. Mia madre e le donne di quel tempo lavavano nel canale-in
questo tempo non c’erano lavatrici, non c’era acqua canalizzata, non c’era
niente-, mia madre vide Catarina scappare con tre figli piccoli e le disse:-“Malgrado
ciò, comare Catarina, dove stai andando?” Lei le rispose: “Vado a Baleizão, voi qui non uscite, non
uscite, ma quando arriva Martedì o Mercoledì tutti uscite, tutti guadagnate e
io non guadagno niente. Vado a Baleizão,
mia suocera resta con i miei figli e io faccio là una ricca mietitura. Mia
madre disse così: “Ai, comare Catarina, malgrado tre figli, cosa fai? Tuo marito guadagna per il pane e
l’olio, dove vai donna”!? Le donne di quel tempo dal momento che avevano pane e
olio per la zuppa…Catarina si voltò verso mia madre e molto arrabbiata le
disse: “E allora che mangiamo solo pane e olio”? Povera fuggi…fuggì a Baleizão e noi per una mietitura a cottimo,
verso i boschi, ai piedi di Corte Condessa, nella parrocchia di Salvada.
Stavamo mietendo, arrivò là il proprietario del raccolto e disse: “ Sapete chi
hanno ucciso a Baleizão? Catarina Eufemia”. Ai, mio Dio….mio Dio, poverina. L'
hanno uccisa per cinque scudi.
Diga-me uma coisa: ela teve essa pequena discussão com a sua mãe, porque a
sua mãe e as mulheres mais velhas satisfaziam-se com pão e azeite, para a
açorda. A Catarina não era da mesma opinião. A Catarina tinha consciência
política?
Mi dica una cosa: lei ebbe questa piccola discussione con sua madre, perché
sua madre e le donne più anziane si soddisfa vano di pane e olio per la zuppa.
Catarina non era della stessa opinione. Catarina aveva coscienza politica?
Tinha. Tinha e muita.
L’aveva e molta.
Ela pertencia a algum partido?
Apparteneva a qualche partito?
Pertencia ao Partido Comunista Português.
Apparteneva al Partito Comunista Portoghese.
A sério?
Davvero?
Sim senhor, sim senhor.
Si signore, si signore
Há quem diga que não...
C’è chi dice di no…
Então nesse tempo qual era o partido que havia?!
Allora a quei tempi che partito c’era?
Não sei...
Non so…
Mas eu sei. Nunca dei notícia de mais nenhum.
Ma io lo so. Non ho mai sentito notizia di nessun altro partito
Só havia o Partido Comunista? Só o PCP é que tinha reuniões com os
trabalhadores? E a senhora, já pertencia ao Partido?
C’era solo il Partito Comunista? Solo il PCP aveva riunioni con i
lavoratori? E lei signora , apparteneva
al Partito?
Eu não pertencia, mas já nessa altura era simpatizante. Já o meu pai era
simpatizante do Partido Comunista. E os meus irmãos também.
Io non vi appartenevo, ma già in quel periodo ero simpatizzante. Mio padre
era simpatizzante e anche i miei fratelli.
Recebia o «Avante» e propaganda política?
Riceveva “l’Avante” (giornale) e propaganda politica?
Isso era uma coisa que tinha de ser muito bem vista. Quem ficava com essas coisas, tinha de as saber esconder, às vezes debaixo
do colchão. Isto era muito mau, não havia liberdade. O meu pai, em sonhando que, de
madrugada, deitavam papéis a falar da situação política, ia buscá-los e vinha
logo para eu ler. Quanto ao «Avante» era preciso um grande segredo, por causa
da Guarda e da PIDE.
Ciò era una cosa che doveva essere valutata molto bene. Chi si occupava di
queste cose, doveva saperle nascondere, a volte sotto il materasso. Ciò era
molto brutto, non c’era libertà. Mio padre sognava che all’alba, buttavano
giornali che parlassero della situazione politica, andava a prenderli e tornava
subito per farmeli leggere. Quanto all’Avante era necessario un gran segreto, a
causa delle guardie e della PIDE.
Chegou a ter reuniões com a Catarina Eufémia?
Arrivò ad avere riunioni assieme a
Catarina?
A gente não chegámos a ter reuniões. Cheguei a trabalhar num sítio em que
as estremas das propriedades de Baleizão davam aqui com as nossas, e a Catarina
juntava-se com os dois grupos, quando íamos à água, e combinava coisas, falava
dos salários, como devíamos fazer.
Noi non avevamo riunioni. Lavorai in un posto ai confini tra le terre di
proprietà di Baleizão e le nostre e, quando andavamo a procurarci l’acqua,
Catarina si univa con i due gruppi, organizzando cose, parlando dei salari e di
come dovevamo fare.
Portanto, ela era uma mulher com consciência política?
Pertanto era una donna con coscienza politica?
Sim, sim, e muita. Do Partido Comunista é que ela era. Eu não dava notícia
de mais nenhum.
Si, si, e molta. Era del Partito Comunista. Io non davo notizie di nient’altro.
E o marido, também?
E suo marito anche?
Eu com o marido já não tinha aquela lidação. Não o ouvia, como a ouvia a
ela. Olhe, era uma coisa fora de série, foi por isso que a mataram. Não havia
por aqui mais nenhuma mulher igual. Ela sabia as coisas e não tinha medo de
nada.
Io con suo marito non avevo quella confidenza. Non lo ascoltavo come
ascoltavo lei. Senta, era una cosa fuori dal comune, è stato per questo che la
uccisero. Da queste parti non c’era nessuna donna uguale a lei. Lei sapeva le
cose e non aveva paura di niente.
Ela esclarecia as outras companheiras? Segundo você me disse há pouco,
quando ela foi trabalhar para Baleizão criticou as mulheres de Quintos, por
ficarem em casa dois ou três dias mas depois irem trabalhar e não terem uma
posição firme...
Catarina spiegava alle altre compagne? Secondo lei, come mi ha da poco
detto, quando Catarina andò a lavorare a Baleizão criticò le donne di Quintos, perché
restavano in casa due o tre giorni ma dopo andavano a lavorare e non
mantenevano una posizione ferma…
Pois, ela via essas coisas todas. E mataram-na por cinco tostões. Ela foi
para lá, e aquele patrão, o Fernando Nunes, em Maio de 1954, dava 12 escudos
[0,06 cêntimos] por dia ao pessoal de Baleizão. As pessoas queriam 12$50 e ele
não quis dar. Então, o pessoal de Baleizão não quis ir trabalhar. Ele foi
buscar pessoas ao Penedo Gordo, por 12$50. Quando as pessoas de Baleizão
souberam, acharam muito mal de ele não querer dar 12$50 ao pessoal da terra e
ir buscar outros e pagar essa quantia. Depois, o que é que a Catarina e outros
trabalhadores de Baleizão, mulheres e homens, fizeram? Tentaram ir falar com os
de Penedo Gordo, queriam interromper, para aquela gente não começar a
trabalhar.
Certo, lei vedeva tutte queste cose. E la uccisero per cinque scudi. Lei
andò là e quel padrone, Fernando Nunes, nel Maggio del 1954, dava 12 scudi
(0.06 centesimi) ciascuno al personale di Baleizão. Le persone volevano 12.50 e
lui non voleva darglieli. Allora il personale di Baleizão non volle andare a
lavorare. Lui andò a prendere persone a Penedo Gordo per quella cifra. Quando
le persone di Baleizão lo seppero lo giudicarono male perché era andato a
prendere altri braccianti per pagare la stessa cifra che loro avevano chiesto.
E dopo cosa fecero Catarina e altri lavoratori, donne e uomini di Baleizão?
Cercarono di parlare a quelli di Penedo Gordo, per farli smettere e per non
cominciare a lavorare.
E depois?
E dopo?
Foi nessa altura - ela era a da frente, porque era uma mulher muito
decidida -, que o guarda disparou a sangue frio.
Fu in quell’occasione- lei era quella che stava davanti, perché era una
donna molto decisa- che la guardia sparò a sangue freddo.
No grupo também havia homens?
Nel gruppo c’erano anche uomini?
Havia. Mas nesse tempo, homens e mulheres, tudo tinha medo. Sofremos tanto,
tanto, tanto... Ai, que esse tempo não volte.
C’erano. Ma a quel tempo, tutti, donne e uomini, avevano paura. Abbiamo
sofferto tanto, tanto….Ai, che non torni più quel tempo!
Era uma seara de favas?
Era una raccolta di fave?
Era. Quando era ceifa de favas, poucas vezes os homens andavam com a gente.
Si. Quando mietevamo fave, poche volte gli uomini venivano con noi.
Porquê?
Perché?
Porqué nas favas tinham de levaras mesmas margens que
a gente [as mulheres] levávamos e os homens tinham de ganhar sempre mais. Os
homens ganhavam mais na «aceifa» do que a gente. No trigo, por exemplo, a gente levávamos
duas margens e os homens levavam três.
Perché alla raccolta di fave dovevano avere gli stessi margini nostri
(delle donne) e gli uomini dovevano guadagnare sempre più di noi. Gli uomini
guadagnavano di più di noi nella mietitura. Nel grano, per esempio, noi
portavamo due margini e gli uomini ne portavano tre.
O que é uma margem?
Cos’è un margine?
Uma margem é um rego. Às vezes a gente estamos falando e as pessoas não
percebem. Na «aceifa», os homens ganham sempre mais uma parte do que as
mulheres. A gente levávamos duas margens e ganhávamos duas partes e os homens
levavam três margens e ganhavam três.
Un margine è una linea divisoria. Alle volte noi parliamo e le persone non
comprendono. Nella mietitura, gli uomini guadagnavano sempre una parte in più
rispetto alle donne.
Nessa altura, dos 12$00/12$50, quanto ganhavam em Quintos?
In quel periodo, dei 12 scudi e 12 e 50, quanto guadagnavano a Quintos?
Pouco mais ou menos a mesma coisa. Isto era tudo o mesmo.
Più o meno lo stesso. Questo era tutto lo stesso.
Quando vocês combinavam as jornas, com a Catarina e com as outras mulheres
ligadas ao PC, ligadas à luta, ela dirigia a conversa? Como é que ela dirigia a
reunião, lembra-se?
Quando voi organizzavate le giornate, con Catarina e con le altre donne
legate al PC, legate alla lotta, lei dirigeva i discorsi? Come dirigeva le
riunioni, si ricorda?
Aquilo não era bem uma reunião, era um encontro. Era na fonte, onde íamos à
água. A fonte era quase à estrema de Vale de Alcaide, que pertence a Baleizão,
com a estrema do Barroca, que pertence a
Quintos. Era aí que as mulheres de Quintos e de Baleizão «se encontrávamos».
Não falávamos só do trabalho, falávamos de outras coisas, que ela dizia à
gente, que a gente éramos umas parvinhas ao pé dela. A mulher sabia.
Quello non era proprio una riunione, era un incontro. Era alla fonte, dove
andavamo a prendere l’acqua. La fonte era quasi al confine della Valle di
Alcaide, che appartiene a Baleizão, con
il confine di Barroca, che appartiene a
Quintos. Era lì che noi donne di Baleizão e Quintos ci incontravamo. Non
parlavamo solo del lavoro, parlavamo di altre cose, che lei ci diceva, perchè
noi eravamo delle “sciocchezzuole” rispetto a lei. La donna sapeva.
Era uma mulher mais esclarecida?
Era una donna più informata?
Ela era uma pessoa com muito.., sabia tudo. Ela discutia com qualquer
pessoa, fosse feitores, fosse tudo, até com os patrões. Uma vez estava com ela
e já não sei o que o patrão lhe disse, que ela respondeu: «Sai daí, malandro, malandros,
não fazem nenhum e têm tudo, e a gente quer semear uma leira de coentros e não
temos onde «assemear». A mulher era muito esclarecida. Não dizia era onde
aprendia nem donde vinham aquelas instruções.
Era una persona con molto…sapeva tutto. Lei discuteva con qualsiasi
persona, fossero fattori, fossero tutto, persino con i padroni. Una volta stavo
con lei e non ricordo cosa il padrone le disse, che lei rispose:” Esci di lì,
malandrino, malandrino, non fate niente e avete tutto, e noi vorremmo seminare
un’aiuola di coriandolo e non sappiamo dove seminare”. La donna era molto
schietta. Non diceva dove apprendeva e nemmeno da dove venivano quelle
istruzioni.
Ela trazia alguns papéis para vocês lerem?
Portava dei giornali per farveli leggere?
Sim, e foi por isso tudo que a mataram, porque ela era uma mulher
diferente, a gente éramos umas parvinhas ao pé dela. Quem lhe dava aqueles
esclarecimentos todos, não sei. Na altura, havia quem dissesse que era o marido
que lhe dava aqueles esclarecimentos todos. Ela chegou a fazer urna angariação
de fundos para o Francisco Miguel...
Si, ed è stato per tutto ciò che la uccisero, perché era una donna diversa,
noi eravamo sciocchezzuole in confronto a lei. Chi le dava tutte quelle
informazioni, non so. A quel tempo, c’era chi diceva che era il marito a darle
tutte quelle informazioni. Lei arrivò a fare una raccolta fondi per Francisco
Miguel….
O Francisco Miguel [já falecido], velho militante comunista, natural de
Baleizão?
Francisco Miguel (ora morto), vecchio militante comunista, originario di Baleizão?
Sim, uma vez juntou um grupo de mulheres e pediu-nos dinheiro para o
Francisco Miguel, que estava preso. A gente arranjámos a maneira de lhe dar,
umas quinze tostões, outras vinte e cinco tostões, à medida que podíamos...
Si, una volta unì un gruppo di donne e ci chiese denaro per Francisco
Miguel, che era prigioniero. Noi trovammo il modo di darglieli, una quindici
scudi, l’altra venticinque, nella misura che potevamo…
Ela conhecia o Francisco Miguel?
Lei conosceva Francisco Miguel?
Não sei, pelos vistos. Já nessa altura ela falava no Álvaro Cunhal.
Non so, di vista. In quel periodo già parlava di Álvaro Cunhal.
Esse nomes para vocês não representavam nada?
Questi nomi per voi non rappresentavano niente?
A gente sabia mais ou menos, mas não conhecíamos, não havia televisões, não
havia nada dessas coisas. A primeira vez que fomos a Baleizão, à homenagem dela
- tanta gente, tanta gente, que aquilo não tem explicação, tanta família -,as
ruas cheias de gente, quem conhecia o Álvaro Cunhal agarrado a ele, «abraçando
nele», eu cá até pensava que era algum da PIDE, pensava que era para fazerem
mal ao homem. Conhecia-o da fotografia, que ainda hoje a tenho em casa, mas
pessoalmente nem sabia quem era.
Noi sapevamo più o meno, ma non li conoscevamo, non c’era televisione, non
c’era nulla di queste cose. La prima volta che andammo a Baleizão, per
omaggiarla- molta gente, molta gente, che non si spiega, tante famiglie, le
strade piene di gente, chi conosceva Álvaro Cunhal stava acchiappato a lui,
abbracciandolo, io pensavo persino che era qualcuno della PIDE, pensavo che
stava lì per fare male agli uomini. Lo conoscevo per la fotografia, che ancora
oggi ho in casa, ma non lo conoscevo personalmente.
Voltando
atrás, a Catarina fez subscrições a favor do Francisco Miguel, que na altura
estava preso?
Tornando
indietro, Catarina fece sottoscrizioni a favore di Francisco Miguel, che in
quel periodo era prigioniero?
Sim senhor.
E aparecia com papéis do Partido Comunista. Eu não conhecia outro partido. Hoje
é que já há mais partidos, mas nesse tempo...
Si signore.
E appariva con giornali del Partito Comunista. Io non conoscevo altro partito.
Oggi ci sono tanti partiti, ma in quel periodo….
Era o único
que defendia os trabalhadores?
Era l’unico
che difendeva i lavoratori?
Pois, então. Aqueles papéis era tudo falando na classe operária, nos
trabalhadores do campo... Por isso eu nunca conheci outro partido.
Certo. Quei
giornali parlavano interamente di classe operaia, di braccianti agricoli…perciò
io non ho mai conosciuto altro partito.
E ela falava do Partido Comunista?
E lei parlava del PC?
Ela falava muito do Partido Comunista. Era do que ela falava sempre,
sempre... Toda a gente, mesmo patrões, dizia que ela era comunista.
Lei parlava molto del PC. Ne parlava sempre, sempre….Tutta la genete, anche
i padroni, dicevano che lei era comunista.
Ela não falava só sobre questões relacionadas com os salários?
Lei parlava solo di questioni legate ai salari?
Falava de tudo. Eu não sei aonde é que ela ia buscar coisas que nós nunca
tínhamos ouvido falar, como a emancipação da mulher, por exemplo. Eu gostava de
ler e não era das mais parvas, mas não conhecia a maioria das coisas que ela
falava. Ela por vezes dava-me coisas para ler... Mas havia aí pessoas que até
tinham medo de lidar com ela. Tinham medo de serem presas. A gente éramos
vigiadas em todo o lado, diga lá!... Até quando íamos apanhar grãos, às tantas
da noite, a guarda ia-nos perseguindo, para apanhar as nossas conversas.
Parlava di tutto. Non so dove andasse a prendere cose di cui noi non
avevamo mai sentito parlare, come l’emancipazione della donna, per esempio. A
me piaceva leggere e non ero tra le più stupide, ma non sapevo la maggior parte
delle cose di cui lei parlava. Catarina a volte mi dava cose da leggere…Ma
c’erano persone che avevano persino paura di frequentarla. Avevano paura di
essere imprigionate. Noi eravamo sorvegliate dappertutto, mi dica lei! Persino
quando andavamo alla raccolta del grano, a un certo punto della sera, la
guardia ci seguiva, per ascoltare i nostri dialoghi.
Houve muitas prisões políticas aqui em Quintos?
Ci furono molte prigioni politiche qui a Quintos?
Daqui nunca foi ninguém preso. Agradecemos ao padre. Ele nunca foi bom para
ninguém, mas nisso foi bom. Vinham aí para saber se havia aqui comunistas, e
ele dizia assim: <‘Aqui em Quintos não há comunistas. Dêem-lhes vinho,
dêem-lhes pão, que aqui não há comunistas». E nunca chegou a denunciar ninguém,
porque ele sabia quem é que lutava por essas coisas, quem escrevia frases nas
paredes.
Mai nessuno fu prigioniero qui. Grazie al parroco. Non piacque mai a
nessuno, ma in questo si. Venivano per sapere se qui c’erano comunisti e lui
diceva così: “Qui a Quintos non ci sono comunisti. Gli danno vino, gli danno pane, perchè qui
non ci sono comunisti”. Non arrivò mai a denunciare nessuno, perché lui sapeva
chi lottava per queste cose, chi scriveva frasi sui muri.
Ainda se lembra dos nomes de antifascistas aqui de Quintos?
Si ricorda ancora i nomi degli antifascisti di Quintos?
Éramos muitos, alguns já morreram. Olhe estou a lembrar-me da Zulmira...
Zulmira Maria da Silva. O pai dela também era simpatizante do PCP. Era assim, a
gente ouvia os nossos pais...
Eravamo molti, alcuni ora sono morti. Mi ricordo di Zulmira… Zulmira Maria
da Silva. Anche suo padre era simpatizzante del PCP. Era così, noi ascoltavamo
i nostri genitori…
E encontravam-se sempre na fonte?
E v’incontravate sempre alla fonte?
Quase
sempre. Ainda chegaram a dizer ao meu marido - na altura éramos namorados: «Não
queiras pôr emenda na tua moça, qualquer dia ainda lhe acontece o mesmo da
Catarina Eufémia». Como eu «ombrava» muito com ela, éramos vizinhas, amigas e
companheiras, íamos trabalhar juntas... Ela era mais velha do que eu, mais
velha mas não muito, aí uns quatro ou cinco anos. Mas a minha natureza era
assim, também gostava da política. E assim que chegou o 25 de Abril, nunca mais
estive sossegada.. –
Quasi
sempre. Arrivarono anche a dire a mio marito- in quel periodo eravamo
fidanzati: “Se non correggerai la tua ragazza, qualche giorno le succederà lo
stesso che a Catarina Eufémia”. Siccome
io spalleggiavo molto con Catarina, eravamo vicine, amiche e compagne, andavamo
a lavorare assieme…Catarina era più grande di me, ma non molto, quattro o
cinque anni. Ma la mia natura era così, anche a me piaceva la politica. E così
arrivò il 25 di Aprile, non fui più tranquilla.
Sossegada?
Tranquilla?
Pois, nunca mais estive sossegada na política.
Certo, non fui più tranquilla in politica.
Ainda voltando às reuniões clandestinas, não se lembra mesmo de nomes de
pessoas?
Ritornando alle riunioni clandestine, non si ricorda proprio i nomi delle
persone?
Era tudo às escondidas. Já não me lembro dos nomes... Lembro-me da fonte e
que, às vezes, durante o trabalho, ficávamos para trás ou íamos mais para a
frente, para falarmos à vontade... Agora o nome das pessoas, já não me lembro.
Avveniva tutto di nascosto. Non mi ricordo più i nomi…Mi ricordo della
fonte e che, a volte, durante il lavoro, restavamo indietro o andavamo avanti,
per parlare serenamente….Ora il nome delle persone non me lo ricordo più.
Tinham muito medo da repressão?
Avevate molta paura della repressione?
Pois. Quem é que tinha uma conversa política aí no meio da rua? A Guarda
cercavam as pessoas... nem podíamos cantar na rua. Os homens tinham muito o
hábito de cantar pelas ruas, chegaram a pontos que tiveram de se deixar disso.
Nem na ponte, naquela ponte ali à entrada da aldeia, se podia cantar. A
rapaziada sentava--se além, no Verão, e canta. Tiveram de se deixar disso. Os
guardas colocavam-se cada um no seu sítio, esperavam os homens e, à medida que
eles iam passando, eram chicoteados. Tenho um irmão que uma vez vinha da ponte,
quando chegou às bicas, estavam os guardas à espera dele... Então e quando foi
do Humberto Delgado?! Alguém sabe o que isto foi? Foi uma luta também que foi
uma coisa a mais.
Certo. Chi si metteva a parlare di politica lì in mezzo alla strada? Le
guardie cercavano le persone…non potevamo nemmeno cantare in strada. Gli uomini usavano spesso cantare
per le strade, arrivarono al punto che dovettero abbandonare quest’abitudine.
Nemmeno sul ponte, su quel ponte lì all’entrata del villaggio, si poteva
cantare. Il gruppo di ragazzi si sedeva laggiù, in estate e cantava. Hanno
dovuto abbandonare quest’usanza. Le guardie si mettevano ciascuno al suo posto,
aspettavano gli uomini e, mano a mano che passavano, venivano frustati. Ho un
fratello che una volta quando arrivò sul ponte, c’erano le guardie ad
aspettarlo…Allora e quando c’è stato Humberto Delgado?! Qualcuno sa cos’è
questo? Ci fu una lotta anche che fu una cosa a parte.
O que é que aconteceu nessa altura?
Cosa successe in questo periodo?
Nessa altura, já as pessoas iam para Beja, para as manifestações... As pessoas já estavam mais esclarecidas e já houve mais um avançozinho. Mas, depois, a partir
dali, quando as eleições acabaram, a Guarda e a PIDE já sabiam aonde é que
estavam os antifascistas e «vinham-nos buscar».
In questo periodo già le persone andavano a Beja, alle manifestazioni…Le
persone erano più informate e già si vedevano piccoli passi avanti. Ma
successivamente, a partire da quel momento, quando terminarono le elezioni, la
Guardia e la PIDE già sapevano dove stavano gli antifascisti e “ci venivano a
prendere”.
Houve muita repressão depois das eleições?
C’è stata molta repression dopo le elezioni?
Sim, muita, muita... Não tem explicação. Toda a gente tinha medo de falar.
Alguém podia dizer que tinha fome? Ninguém. Ninguém podia dizer «eu quero
trabalhar, quero ganhar para o pão». Então foi por isso que mataram a Catarina.
Só por dizer que queria trabalhar para matar a fome aos filhos. E se alguém
refilava no trabalho, no outro dia já não o deixavam pegar ao serviço. Era tudo
à vontade dos senhores.
Si, molta, molta…Non ha spiegazione. Tutta la gente aveva paura di parlare.
Qualcuno poteva dire che aveva fame? Nessuno. Nessuno poteva dire “voglio lavorare,
voglio guadagnare per il pane”. Allora fu per questo che uccisero Catarina.
Solo perché aveva detto che voleva lavorare per togliere la fame ai figli. E se
qualcuno si rifilava dal lavoro, il giorno dopo non gli lasciavano più prendere
servizio. Tutto dipendeva dalla volontà dei signori.
Acha que estas gerações mais novas sabem o que se passou nesse tempo? Os
seus netos que idade têm?
Pensa che le nuove generazioni sappiano cosa successe in questo periodo? I
suoi nipoti quanti anni hanno?
Tenho um quase com 20 anos.
Ho un nipote di quasi vent’anni.
Ele tem ideia do que se passou nesse tempo?
Lui ha un’idea di cosa accadde in quel periodo?
Tem, mas...
Si, ma…
Já teve estas conversas com ele?
Ha fatto già questi discorsi con lui?
Sim, mais ou menos os moços de agora sabem, mas
fazem-se desentendidos. Eles nem acreditam!
Si, più o meno i giovani d’oggi sanno, ma fingono di non capire. Nemmeno ci
credono!
Eles sabem que vocês passaram fome? Hoje praticamente têm tudo, enquanto a
sua geração por vezes nem um naco de pão tinha...
Loro sanno che voi avete fatto la fame? Oggi c’è praticamente tutto, mentre
la sua generazione alle volte non aveva nemmeno un tozzo di pane…
Eles hoje têm tudo. Têm pão, carne, iogurtes, leite...
têm tudo. Não fazem ideia do que é passar fome, querer um pouco de pão e não o ter.
Não fazem ideia do que é ter só uma muda de roupa para vestir. Não fazem ideia
como a gente trabalhávamos...
Loro oggi hanno tutto. Hanno pane, carne, yogurt, latte….tutto. Non hanno
idea di cos’è fare la fame, voler un poco di pane e non averlo. Non hanno idea
di cos’è avere solo un cambio di roba per vestirsi. Non hanno idea di come
lavoravamo….
E você e a sua família não foram dos que passaram pior...
E lei e la sua famiglia non eravate tra quelli che se la passavano peggio…
Na
casa dos meus pais nunca passámos fome, mas trabalhámos muito, muito, muito...
Eu ainda escapava melhor porque era a única filha. Os meus irmãos começaram
trabalhar, com o meu pai, a guardar gado, com cinco anos. Não eram os meus
irmãos que o ganhavam, eram os cães que o meu pai trazia, que o ajudavam com o
rebanho. Mas os meus irmãos tinham de andar sofrendo, penando, atrás do meu
pai, porque não podiam estar em casa e ganhar o ordenadinho e as comedias.
Mesmo que não fizessem nada, tinham que andar ao frio e ao calor, só com cinco
anos.
Nella casa dei miei genitori non abbiamo mai patito la fame, ma lavoravamo
molto, molto, molto…A me è andata meglio perché ero l’unica figlia. I miei
fratelli hanno cominciato a lavorare con mio padre, a occuparsi del bestiame a
cinque anni. Non erano i miei fratelli a guadagnare il pane, erano i cani che
mio padre portava, ad aiutarlo con il gregge. Ma i miei fratelli dovevano
soffrire, penare, dietro mio padre, perché stando in casa non potevano
guadagnare il piccolo stipendio e i cibi. Anche se non facevano niente,
dovevano andare al freddo e al caldo a soli cinque anni.
E eles andaram na escola?
Loro andarono a scuola?
Tenho muita pena dos meus irmãos, porque os mais velhos nenhum sabe ler.
Mi dispiace molto dei miei fratelli, perché i più grandi non sanno leggere.
Eles andavam com o seu pai a ajudar a orientar o rebanho e o agrário
dava-lhes qualquer coisa...
Loro andavano con suo padre ad aiutare ad orientare il gregge e l’agricoltore
gli dava qualcosa..
Pois, se o
meu pai havia de meter um de fora, tinha os filhos.., e andava à vontade dele.
Que eles fizessem, que não fizessem, que o meu pai se zangasse, que não se
zangasse... eram os filhos dele. Mas bastante sofremos todos.
Por isso, acho que todos temos as mesmas ideias.
Certo, se mio padre avesse dovuto cacciare qualcuno, aveva I figli…e faceva
ciò che desiderava. Che loro (i
fratelli) facessero o non facessero, che lui si arrabbiasse o no….erano suoi
figli. Ma abbiamo sofferto tutti abbastanza. Perciò penso che abbiamo tutti le
stesse idee.
Quando foi o funeral da Catarina, o que é que aconteceu aqui em Quintos?
Quando ci fu il funerale di Catarina, cosa accadde qui a Quintos?
Eu não estava cá, estava nos matos, para lá da Corte Condessa, onde a gente
não via ninguém. Tenho um primo-irmão, que ainda é vivo, que trabalhava numa
padaria e, então, como estava aqui na aldeia, porque trabalhava de noite, o
regedor chegou ao pé dele e disse-lhe: «Chico, devias ir chamar o Tio António
Paulino - era o enterrador, que estava numa hortinha ali ao pé da ponte do
Guadiana -, porque morreu uma velhota dos matos».
Io non ero qui, ero nei boschi, oltre Corte Condessa, dove noi non abbiamo
visto nessuno. Ho un cugino, che ancora è vivo, lavorava in un panificio e,
allora, siccome era qui al villaggio, perché lavorava la sera, il reggente di
Quintos arrivò davanti a lui e disse: “Chico, dovresti andare a chiamare lo zio
António Paulino- era il becchino, che viveva li in un piccolo campo ai piedi
del ponte del Guadiana-, perché è morta una vecchia dei boschi”.
Disseram que era o funeral de uma velhota e não da Catarina, para o povo
não ficar a saber?
Dissero che era il funerale di una vecchia e non di Catarina cosicchè il
popolo non lo scoprisse?
Sim. O meu primo foi dizer ao enterrador. Como era uma velhota dos matos,
ninguém acompanhou o corpo à cova. Só quem foi ao funeral foram algumas
velhotas de cá, que já não podiam nada na vida - porque nesse tempo em se
podendo com a foice e com o sacho tinha que se trabalhar, porque não havia
reformas -, foram ao funeral e qual não foi o seu espanto quando viram que era a
Catarina. Ela foi sepultada com a roupa com que a mataram. A coitada não foi
acompanhada, esteve sempre fechada no hospital para a autópsia, foi tudo às
escondidas...
Si. Mio cugino andò ad avvisare il becchino. Siccome era una vecchia dei
boschi, nessuno ha accompagnato il corpo alla fossa. Andarono al funerale solo
alcune anziane di qui, che non avevano più niente da fare nella vita-perché in
questo periodo non potendo usare zappa e falce non avevi lavoro, perché non
c’erano pensioni-così andarono al funerale e rimasero sbalordite quando videro
che era Catarina. Fu sepolta con i vestiti che aveva addosso quando la
uccisero. La povera non fu accompagnata, rimase chiusa all’ospedale per
l’autopsia, avvenne tutto di nascosto.
O marido e os filhos não foram ao funeral?
Il marito e i figli non andarono al funerale?
Os filhos eram pequenos e o marido acho que não foi. Ainda vieram pessoas
de Baleizão, embora não soubessem quando era o funeral, mas a guarda não
permitiu e, no regresso, já não foram pela estrada, foram aí pelos barrancos, a
corta-mato...
I figli erano piccoli e il marito penso che non andò. Arrivavano persone di
Baleizão, nonostante non sapessero quando fosse il funerale, ma la guardia non
li fece passare e, al ritorno, non erano più in strada, ma lì a correre verso i
dirupi…
Havia pessoas de Baleizão que queriam vir a Quintos ao funeral?
C’erano persone di Baleizão che volevano venire a Quintos al funerale?
Pois, ainda tentaram, mas nem souberam, ninguém soube,
foi tudo às escondidas.
Certo, provarono pure, ma non lo seppero, nessuno lo seppe, fu tutto di
nascosto.
A Guarda e as autoridades da altura tinham consciência que tinha sido um
crime político e ia haver uma reacção das populações de Quintos e Baleizão?
La Guardia e le autorità di quel periodo avevano coscienza che c’era stato
un crimine politico e poteva esserci una reazione degli abitanti di Quintos e Baleizão?
Pois, pois, pois...
Certo, certo, certo…
Como é que se chamava o regedor de Quintos?
Come si chiamava il reggente di Quintos?
António Francisco Felizardo.
António Francisco Felizardo.
Que profissão é que tinha?
Che lavoro faceva?
Tinha uma padaria. Ele pouco amigo era de trabalhar, coitado.
Aveva un panificio. Era poco amico del lavoro, povero.
Como é que se chama o seu primo?
Come si chiama suo cugino?
Francisco Manuel Luís.
Francisco Manuel Luís.
O regedor falou com o seu primo?
Il reggente parlò con suo cugino?
Pois, para ir chamar o enterrador.
Si, per chiamare il becchino.
O seu primo trabalhava na padaria do regedor?
Suo cugino lavorava al panificio del reggente?
Não, trabalhava noutra, de uma prima-irmã do meu primo.
No, lavorava in un’altra, di una sua
cugina.
Como é que se chamava o enterrador?
Come si chiamava il becchino?
Não sei bem, era o Tio António Paulino.
Non so bene, era lo zio António Paulino.
O que é que fazia, além de enterrador?
Cosa faceva, oltre al becchino?
Era trabalhador agrícola.
Bracciante agricolo.
[Silêncio]
(Silenzio)
Pois isto deu uma volta muito grande com o 25 de Abril.
Per ciò ci fu una svolta molto grande con il 25 Aprile.
A senhora Mariana foi presidente da Junta de Freguesia de Quintos depois do
25 e Abril?
Signora Mariana, è stata presidente della Giunta Comunale di Quintos dopo
il 25 Aprile?
Fui, durante oito anos. De 1985 até 93, acho eu... E já tinha sido
tesoureira durante três anos.
Si, per otto anni. Dal 1985 al ’93, credo. Già ero stata tesoriera per tre
anni.
Que tal a experiência?
Come fu l’esperienza?
Boa. Só tive muita pena que tivesse acontecido o que aconteceu ao meu
marido, porque a partir do dia em que ele adoeceu já não tive tempo nem cabeça
para essas coisas. Eu só não fiz parte da primeira junta depois do 25 de Abril,
porque o meu marido estava na Alemanha, assim que ele regressou nunca mais
estive quieta.
Buona. Soltanto ebbi molto dispiacere di ciò che accadde a mio marito, perché
a partire dal giorno in cui si ammalò, non ebbi più tempo e nemmeno testa per
queste cose. Non feci parte solo della prima giunta dopo il 25 Aprile, perché mio
marito era in Germania, non appena tornò non ebbi più pace.
Fez multa obra?
Ha fatto molti lavori?
Não é para me gabar, mas nunca nenhum foi capaz de fazer o que eu fiz. E a
bem dizer sozinha... Olhe, por exemplo, depois da Reforma Agrária, houve uma
propriedade que foi devolvida, o homem veio ter comigo, que era a presidente da
Junta, e disse-me que, se ele ficasse com a oficina que tinha sido da UCP, dava
um bocado de terra à Junta de Freguesia. Fui falar com o presidente da Câmara,
que me aconselhou a fazer o negócio, fizemos a escritura e, hoje, nesse terreno
é onde toda a gente de Quintos pode semear. Cada qual tem o seu bocadinho para
semear favas, ervilhas, batatas... Mas o terreno é da Junta de Freguesia.
Noutro lado, já vendemos 13 lotes de terreno para construção de habitações... e
o dinheiro é para a autarquia. Quando acabou a Reforma Agrária, o pouco dinheiro
que havia, em vez de ser dividido por todos, foi para ajunta, para ajudar a
construção da casa mortuaria.
Non per vantarmi, ma mai nessuno è stato capace di fare ciò
che ho fatto io. E a ben dire sola….Senta, per esempio, dopo la Riforma Agraria,
ebbi una proprietà che fu devoluta, il presidente della Giunta venne da me e mi
disse che se fosse rimasto con il laboratorio che era stato del UCP, avrebbe dato
un pezzo di terra alla Giunta Comunale. Andai a parlare al sindaco, che mi consigliò
di fare l’affare, facemmo l'atto e oggi questa terra è dove tutta la gente di
Quintos può seminare. Ognuno ha la sua parte per seminare fave, piselli, patate
... Ma il terreno è del Comune. Altrove, abbiamo venduto 13 lotti di terreno per
la costruzione di alloggi ... e il denaro è per il Comune. Al termine della riforma
agraria, il poco denaro che avevo, invece di essere diviso per tutti, fu per la
Giunta Comunale, per aiutare a costruire il cimitero.
Foi uma boa experiência?
E’ stata una buona esperienza?
Sim, nunca tive problemas em nada... nunca tive vergonha de ir falar com
este ou aquele, com o presidente da Câmara ou com um vereador, com um
engenheiro... Nunca me atrapalhei. Ser autarca, servir a minha freguesia, foi
um trabalho que fiz de alma e coração.
Si, non ebbi mai problemi in niente…non ebbi mai vergogna di parlare con
questo o quello, con il sindaco o con un consigliere, con un ingegnere…Non m’imbarazzai
mai. Essere autarchica, servire il mio Comune, è stato un lavoro fatto con
cuore e anima.
Um trabalho a bem da população...
Un lavoro per il bene della popolazione…
Por exemplo, no meu tempo, a junta de Freguesia chegou a vender sepulturas
a 15 contos, pagas às prestações... Se não for assim, a gente não tem nada. É a
gente, porque temos as feridas, agora quem não sofreu, quem não penou... Às
vezes, esses que penaram já eles estão esquecidos, quanto mais quem não sofreu.
Per esempio, al mio tempo, la giunta era arrivata a vendere
le sepolture a 15 contos, prestazioni incluse (funerali). In caso contrario, la
gente non avrebbe avuto nulla. E noi, perché
abbiamo le ferite... A volte coloro che hanno sofferto sono già dimenticati, tanto più da chi non ha
sofferto.
* Publicada parcialmente in «Alentejo Popular», 25 de Abril de 2003
Pubblicata parzialmente in “Alentejo Popular”, 25 Aprile 2003.
Catarina Eufémia filiou-se no Partido Comunista
Português em 1953, tendo feito parte do Comité Local de Baleizão, conforme
depoimento de António Gervásio
Catarina Eufémia si affiliò al Partito Comunista Portoghese nel 1953,
avendo fatto parte del Comitato Locale di Baleizão, secondo la testimonianza di
António Gervásio